EM FOCO

Marlos Gomes

Opinião de Marlos Gomes

Pesquisador do CPJM

setembro, 2020.

As investigações internas corporativas encontram o seu fundamento no dever de diligência das empresas e na ideia de “empresa cidadã”, aquela que atua em cooperação com os poderes públicos para prevenir a infrações como a corrupção, fazendo as vezes da autoridade de enforcement na apuração de potenciais desvios praticados no ambiente corporativo – bem como a eventual responsabilização dos indivíduos envolvidos.

Para tanto, a fim de apurar os fatos decorrentes de uma denúncia, por exemplo, os advogados – internos ou externos – responsáveis por conduzir a investigação interna deverão superar uma etapa extremamente crítica e que impõe cuidados adicionais, qual seja, a série de entrevistas. Entrevistar um funcionário ou terceiro externo à companhia, antes de tudo, exige o compromisso do profissional com aspectos éticos e de observância à garantias fundamentais.

Neste sentido, uma expressão bastante comum utilizada desde o início de qualquer investigação interna corporativa nos Estados Unidos é o aviso ou alerta Upjohn, ou Upjohn Warning. A sua origem remonta ao Caso Upjohn Company vs. United States, onde a Suprema Corte norte-americana decidiu que o direito ao sigilo proveniente da comunicação entre advogado e cliente – empresa – se estende também as comunicações realizadas entre o advogado e os colaboradores da corporação.

Assim, todo advogado deve avisar – ou advertir – o entrevistado que ele está atuando na qualidade de patrono ou constituído da empresa; não do colaborador. Ademais, apesar do sigilo conferido a tais comunicações, é provável que a empresa se valha das provas produzidas, incluindo as entrevistas realizadas, para cooperar com as autoridades – alternativa a ser legitimamente ponderada sempre que houver chances de firmar um acordo de resolução pacífica de conflitos ou não persecusão criminal, sendo certo que todo e qualquer acordo ou ato de colaboração envolve a indicação dos fatos e dos indivíduos que concorreram para o ilícito.

Em resumo, antes de iniciar qualquer entrevista, o advogado deverá fazer as seguintes advertências:

  • 1º Ele, o advogado (interno ou externo), não representa o entrevistado, mas sim a empresa que o contratou;
  • 2º A entrevista é protegida pela confidencialidade;
  • 3º Que a referida confidencialidade, oriunda da comunicação advogado-cliente, pode ser renunciado pela empresa;
  • 4º Caso a empresa renuncie a tal direito, as provas produzidas em sede de investigação interna poderão ser compartilhadas com as autoridades competentes;
  • 5º Que faltar com a verdade sobre um determinado fato questionado em sede de entrevista pode ser considerado obstrução de justiça;
  • 6º Que o entrevistado não poderá compartilhar com nenhuma parte não autorizada os termos da entrevista;

Deste modo, em que pese as investigações internas serem fundamentais para a revelação das condutas ilícitas e, eventualmente, dos indivíduos infratores, há riscos de violação de garantias fundamentais no ambiente corporativo e, para tanto, deve-se ter atenção para que todo o procedimento de apuração interna observe os direitos processuais penais, bem como seja orientado pela ampla defesa/contraditório, ordenado por meio metodologicamente verificável – sob pena de expor a riscos de nulidade de provas ou até mesmo de indenização por danos materiais e morais.

Embora se trate de matéria ainda incipiente no Direito brasileiro, entendo perfeitamente válido e aplicável no âmbito das investigações internas próprio dos programas de compliance de empresas aqui existentes os termos e formas do Alerta Upjohn.