EM FOCO

Vander A. Giordano

Opinião de Vander A. Giordano

Advogado e Administrador de Empresas, com MBA em Gestão. Vice-Presidente Institucional e de Compliance do grupo Multiplan, é membro do Conselho da ABRASCE e do Conselho Consultivo do AMB Lab.

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janeiro, 2021.

O Brasil já demandava há algum tempo um mecanismo legal de aprimoramento e regramento para a conduta da iniciativa privada e suas relações com o poder público. Ainda que o Código Penal tipificasse o crime de corrupção, o que poderia ser suficiente para o entendimento da ofensa penal, o legislador entendeu que havia a necessidade de um dispositivo específico para normatizar a relação público-privado. A vigência da Lei 12.846/2013 foi fundamental para a descrição da responsabilidade objetiva nas esferas administrativa e civil das empresas pela prática de atos contra a Administração Pública.

Adicionalmente, as ações das entidades com poder de polícia e investigação no combate às transgressões penais, como a operação lava jato, trouxeram para a sociedade uma percepção de punibilidade mais assertiva. A combinação do dispositivo legal com a aplicação no caso prático demonstra a eficácia do sistema penal na organização da sociedade.

Este direcionamento combinado, porém, não é suficiente para chegarmos aos níveis desejáveis na redução dessas condutas perversas. Primeiramente, destaco que a burocracia definha a nossa sociedade, pois gera a dificuldade, que muitas vezes é o dispositivo de pressão para a procura da facilidade. Simplificar o sistema ajudaria os órgãos fiscalizadores, desoneraria as atividades produtivas e tornaria a relação mais transparente. Para não analisar uma situação em específico, vejamos, a título de ilustração, a quantidade de documentos pessoais exigidos pelo Estado: – Certidão de Nascimento, RG, CPF, Carteira de Habilitação, Alistamento Militar, Título de eleitor, Carteira de Trabalho, PIS e PASEP, Passaporte, Carteira de Registro de Classe, dentre outros. Com tanta tecnologia à disposição, não poderíamos ter um único número ou algoritmo de identificação? Isso não ajudaria a reduzir o custo e a estrutura do Estado que é demasiadamente pesada para a nossa sociedade?

Para evoluirmos o modelo de controle e organização da nossa sociedade no âmbito penal, não basta somente desenvolvermos dispositivos legais modernos, realizarmos operações policiais de investigação, desburocratizarmos a estrutura estatal. Temos que pensar também em uma forma de revogar a famosa “Lei de Gerson” ou o famoso “jeitinho brasileiro” para criarmos valores mais sólidos e reforçarmos princípios fundamentais que sustentem a base do convívio harmônico, justo e legal da vida em sociedade.

Parar o veículo em fila dupla ao deixar os filhos no colégio, jogar papel pela janela do carro na via pública, furar a fila, não respeitar a faixa de pedestres, fraudar o recibo médico para apresentar ao plano de saúde, instalar a “gatonet”, dentre outros, são ações que vemos no cotidiano da população em várias cidades. Esses tipos de conduta mostram que as pessoas que agem desta forma o fazem muitas vezes de maneira contrária àquilo que pregam.

Se quisermos um país melhor, mais justo e um ambiente mais igualitário precisaremos rever nosso comportamento como cidadãos. As pessoas precisam compreender que esses pequenos delitos morais inseridos no cotidiano não contribuem para a formação de valores éticos e de caráter. A mesma população que condena a ação dos corruptos porque destrói recursos tão importantes para a saúde, educação e segurança, além de seus próprios valores, precisa lutar contra as pequenas transgressões e acabar com a percepção de que podemos dar um jeito em tudo, a qualquer preço, sem se preocupar se os meios justificam sim os seus fins.

Um programa de conscientização da população com a participação da iniciativa privada juntamente com os órgãos de controle, como Ministério Público e Controladorias Gerais, através de ações sociais e programas educativos amplamente divulgados poderia ser o pontapé para construirmos uma sociedade melhor.